Num dia sorrimos e no outro também. Porém, entre os
dias existe a noite, instante propício para a reflexão chegar e assaltar a
consciência. É a noite que ocorrem as despedidas dos entes queridos, os sonhos
impossíveis e os amores improváveis. Noite é um estado e não somente uma
mudança natural do mundo. O dia pode ser noite e a noite pode durar mais do que
vinte e quatro horas.
Bem cedo, aquele moço percebeu que a vida seria uma
constante arena de lutas, mas que também seria uma fonte inesgotável de
possibilidades, aprendizados e de maravilhas. Ainda menino, descobriu o amor
pela igreja e pelo pai do universo: Deus. A sua família era muito católica e
freqüentava as missas aos domingos.
Benedito nasceu no ano de 1960, no dia 25 de outubro,
no subúrbio de Salvador, na Bahia. Era negro e o quinto filho de sete irmãos. A
família era pobre, mas bastante amorosa. A infância foi simples e, embora a
comida nunca tenha faltado, os dias foram difíceis, em razão do grande aperto financeiro.
O dinheiro nunca dava nem para o básico, como comprar pão e leite. Mas tudo se
ajeitava.
O menino desde cedo passou a ser conhecido como “Di”,
pois ele tinha uma irmã com retardo mental que não conseguia falar o seu nome
completo, por isso só pronunciava a sílaba “di”, de Benedito. Di seria no
futuro um herói anônimo.
Após chegar à adolescência, Di não sabia muito bem o
que fazer da vida para ganhar dinheiro. Recolheu papelão para vender, entregou
jornais e trabalhou como ajudante na feira-livre municipal. No entanto, aos
dezoito anos achou a sua vocação: ser pastor de uma igreja evangélica.
Di começou a namorar uma menina chamada Marta, que
frequentava uma igreja evangélica conhecida como Túnel de Jesus. Logo, Di
passou a acompanhá-la e acabou gostando da oratória do pastor. Mais tarde,
tornou-se um membro da igreja Túnel de Jesus.
O tempo passou e o moço franzino, que usava óculos
com lentes grossas, tornou-se assistente do pastor e, posteriormente, foi
convidado para ser um desbravador na cidade de São Francisco do Conde. Ele
seria o responsável por fazer os cultos iniciais e, mais tarde, por fundar uma
igreja Túnel de Jesus.
Di fez a sua parte. Ele foi para São Francisco do
Conde, sozinho. Terminou o namoro com Marta e trabalhou muito de sol a sol.
Dormia pouco e evangelizava muito. Ganhou um terreno, materiais e em mutirão
ergueu mais um templo da igreja Túnel de Jesus.
Depois Di arrebatou mais fiéis, ganhou instrumentos
musicais para a igreja e os cultos melhoraram. Di dormia na igreja. Tinha vinte
e três anos e um sonho: fazer o bem.
Porém, certo dia apareceu um velho amigo de Di, o
pastor que lhe mandará desbravar em São Francisco do Conde. Ele veio agregar a
nova igreja. Di, a princípio não percebeu e quando se deu por conta já havia
outro pastor em seu lugar e ele estava sem igreja, sem casa e sem ter para onde
ir.
Segundo o pastor dirigente da igreja Túnel de Jesus,
Di havia perdido a direção da pregação da doutrina da igreja e esta precisava
de um novo pastor, a fim de que os rumos fossem retomados. A manobra utilizada
pelo pastor foi trazer um pregador eloqüente, casado, mais experiente e culto.
Di era só um “menino” e foi trocado sem escrúpulos ou pedidos de desculpas.
Di pensou em se matar. Estava desiludido com todos
inclusive com Deus. Começou a trabalhar como representante de uma empresa de
bebidas. Experimentou drogas. Prostituiu o seu corpo deitando em camas
pestilentas. Arrumou confusões. Chorou sozinho e em público.
Mas, o tempo da dor passou e ficou a lição. Di se reergueu,
prestou um concurso público para o cargo de comprador e ali viu que Deus não
havia se esquecido do bem que ele havia semeado em São Francisco do Conde. Das
50 perguntas que tinha para responder Di acertou 24, o mínimo para passar era
25, estava reprovado. Mas, como Deus tinha um crédito para lhe conceder,
permitiu que uma questão que Di tinha errado fosse anulada, e ele acertou 25.
Foi então aprovado.
Começou a trabalhar na Prefeitura de Salvador, na
Bahia, na função de comprador. Conheceu uma distinta moça, Márcia, e com ela se
casou aos trinta anos. Teve três filhos e com a vida continuava a lutar.
Aos quarenta anos de idade, em um dia frio de agosto,
estando a mega-sena acumulada, Di na hora do almoço, com o troco do
restaurante, fez uma aposta, gastou míseros dois reais e faturou sozinho o
prêmio de cento e trinta e três milhões de reais.
Di teve certeza que Deus estava sorrindo para ele e
dizendo: “meu filho eis ai minha recompensa pelo teu trabalho em São Francisco
do Conde”. O cargo de comprador tinha sido apenas aperitivo, este prato de
felicidade era o principal.
Passado seis meses da retirada do prêmio, Di pediu
discretamente demissão da Prefeitura de Salvador. Abriu uma empresa de
consultoria e começou a trabalhar com empresas, órgão públicos, igrejas e
comunidades. Ele ministrava um curso de Engenharia Humana, no qual focava na
melhora do ser humano. Suas palestras eram concorridíssimas e gratuitas.
Ele trabalhou até os oitenta e dois anos, quando
passou em definitivo a empresa para os seus filhos, em uma sexta-feira do mês
de dezembro. Naquela noite, deitou-se e agradecido chorou. Ao pensar na sua
vida ele agradeceu muito a Deus, pois enxergava a mão do Criador em cada
instante de proteção. Ele adormeceu, abraçado com a esposa, Márcia, que fora
uma guerreira e companheira leal.
Na manhã seguinte, a idosa esposa de Di percebeu o
corpo frio do esposo. Ele havia partido durante a noite. O pôr-do-sol em
Salvador para ela nunca mais teria a mesma beleza, pois o sol da sua existência
havia se apagado.
Benedito da Costa Azevedo foi um herói anônimo, um
pastor traído que teve como recompensa o próprio bem que ele semeou. Viveu,
Chorou e sorriu. Amou e se encantou. Foi humano!
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